terça-feira, 29 de março de 2011

Das estréias e suas emoções


(Foto: Getty Images)

Algumas coisas são inevitáveis na vida. Uma delas é a sensação que sentimos (tensão, nervosismo, receio) quando estamos diante de uma primeira vez. Por um segundo, voltamos à nossa essência mais pura, beirando o infantil, que gera o medo e resulta naquela clássica tremedeira, quase imperceptível aos olhos alheios, naquele frio na barriga, naquela inquietação nos lábios... seja o que for, são expressões sinceras que tentam traduzir nossos pensamentos naquela hora, o que seria impossível fazer com palavras, tamanha a freqüência e velocidade com que estamos receando que a estréia dê errado.

O primeiro dia na escola. O primeiro campeonato (de qualquer coisa). O primeiro encontro. O primeiro beijo. A primeira vez. O primeiro emprego (e o primeiro dia em qualquer novo emprego). O primeiro show. O primeiro grande show. Podemos fingir para todo mundo, mas no fundo, o que mais passa pela cabeça é: “será que vai dar tudo certo?”. E, ironicamente, este medo passa independente do resultado ser positivo ou não. Quando dá certo, sorrimos com orgulho. Quando dá errado, sei lá, ficamos tristes, irritados, não sei... mas o nervosismo, a tensão, vai embora.

Gosto de prestar atenção a esses sentimentos, neste caso, tão rápidos, tão passageiros, mas tão sinceros, tão genuínos. Lembro-me do primeiro show que fiz, há 8 anos; nossa! Deu de tudo: branco (achei que não lembraria a letra da música), frio no estômago, inquietação nas mãos, dor de barriga (ridículo, mas corri para o banheiro minutos antes de me apresentar). Naquela época, ainda na escola de música, Schubert, seria uma apresentação rápida; uma música, mas mesmo assim, o nervosismo foi inevitável. Depois que passou: “foi só isso? Assim, tão rápido? Tão normal?” e o mundo sai do modo “pausa” e volta a rodar normalmente.

Em uma esfera bem maior, são clássicas as histórias de artistas famosos que morrem de medo de estréias e, não raro, beiram o desastre em algum momento, como por exemplo, o tombo que Gessinger levou no início de sua carreira nos Engenheiros do Hawaii, naquele que foi o primeiro show grande que fizeram (segundo contam, não sei se o foi de fato). E, lá no meio do show, aquele que deveria ser o desastre foi apenas um pequeno detalhe, pois a platéia já estava dominada pelo que realmente importava: a arte. Nando Reis já admitiu ficar nervoso até hoje antes dos shows.

É engraçado, mas isso meio que iguala as pessoas. Coloca todos no mesmo barco. Quão poderosas são as estréias! Este talvez seja um dos poucos medos que posso dizer ser bonito. Vamos controlá-lo, sim, para que não estrague o que temos que fazer, mas deixemos que aconteça para que a emoção tenha o seu espaço e para que possa servir de lição ou, ao menos, nos lembre que somos humanos.

Sentir, emocionar, admirar.


sábado, 19 de março de 2011

Conexões esquisitas: brancos e improvisos


Estava tocando violão outro dia e fui surpreendido por uma situação um tanto chata, para quem toca: esqueci a letra da música, que era uma das quais costumava tocar com bastante freqüência há alguns anos. Para não perder a faísca da idéia, acabei ligando a minha experiência com o universo maximizado dos artistas famosos que, eventualmente (ou não), passam por esta situação.

Eddie Vedder, vocalista do Pearl Jam
Tim Maia, por exemplo (lembrei logo dele por ter escrito o meu último post sobre o mesmo), embora não admitisse, frequentemente esquecia uma ou outra letra da sua música. Por improviso de gosto questionável, simulava defeitos técnicos no som e brigava com o operador de áudio para desviar a atenção. Claro que isso não saiu da boca do Tim e, sim, do operador em questão, mas, vamos lá, todo mundo sabe que isso é muito provável de ser verdade. Se é de fato ou não, nunca saberemos.

Outro que costuma esquecer as letras, vez ou outra, é Eddie Vedder, Pearl Jam. Este é mais rápido no improviso e, certa vez, cantando Black esqueceu a primeira parte, lembrou da segunda e decidiu, para não “deixar a peteca cair”, substituir uma pela outra. Quando chegou a vez da segunda parte ele já havia lembrado da primeira e manteve a substituição, evitando o mico de cantar de novo a segunda. Claro que, se não lembrasse, havia outras saídas: encurtar a música, deixar um solo rolar (mas aí dependeria de uma absurda sintonia com os guitarristas e, sim, acredito que haja isso neles) ou pagar o mico mesmo e repetir a segunda parte. Convenhamos que o fã não está muito preocupado com isso na hora do show.

Raul Seixas
Para mim, o mestre de brancos em shows é o grande Raul Seixas. Este sim esquecia as letras com uma freqüência quase que religiosa! Por conta da bebida, sim, mas isso não muda o fato. O problema é que esta causa do esquecimento também impedia a ação do improviso: pensamento rápido. E como Raul é Raul, ele também não se preocupava tanto assim. Muitas vezes ele apelou para um dos truques mais manjados – o famoso “só vocês”. Outras vezes ele simplesmente admitiu que não lembrava e passou a música. E, a solução que eu mais gosto dele, algumas vezes ele inventava uma letra na hora. E quando fazia isso, acho que nem sempre era por esquecimento. Acredito até que em alguns casos ele estava tão na vibe do show que queria falar outra coisa e pronto.

Bom, isso tudo alivia meu aborrecimento por ter esquecido a letra da música que eu tocava no violão, sentado no sofá de casa, afinal, se Tim Maia, Eddie Vedder e, principalmente, Raul Seixas podiam se dar ao luxo de esquecer letras das próprias músicas (e eram/são indiscutivelmente geniais), por que um reles mortal como eu não posso? Não sei se é trash, espero que não, mas vou encerrar com uma das situações em que Raul decidiu mudar a letra da sua música. O vídeo é do magnífico acervo do Raul Rock Club. O improviso é engraçado!

Valeu!




terça-feira, 15 de março de 2011

A voz que ainda ecoa


Tim Maia (Foto: blog Ribeirão Preto Musical)

Era 15 de Março de 1998. Há 13 anos não temos mais Tim Maia. Não sei por que a mídia gosta de ignorar sua morte, mas eu vou pedir licença aos roqueiros e dedicar este texto a ele. E tenho certeza que ninguém achará errado.

Sebastião Rodrigues Maia, como sua mãe o batizou, começou sua carreira no final dos anos 50, com a banda Tijucanos do Ritmo (ele morava no bairro da Tijuca, Rio de Janeiro) e, depois, em 57 fundou o The Sputniks, do qual Roberto Carlos fez parte também. Na verdade, Roberto Carlos, Erasmo, Tim e Jorge Bem eram conhecidos entre si desde novos. Particularmente, acho que tudo começou para Tim Maia com a sua viagem aos Estados Unidos, em 59. Por mais que se diga ter sido desastrosa (foi preso e deportado depois de 4 anos), foi o momento em que adquiriu sua identidade musical: o Soul music.
(Foto: Jovan Macedo)

Que os fãs mais fervorosos me desculpem, mas a verdade é que nos tempos pré-viagem o Tim não se destacou nas bandas que fez. Foi depois do retorno é que pôde moldar o seu estilo, o seu som e aí, à partir do final dos anos 60, ninguém mais o segurou.



Não tenho lembrança da primeira música que ouvi de Tim Maia, mas o que sempre me chamou atenção nele foi sua contradição poética; ele cantava músicas românticas, muitas vezes, simploriamente românticas e tinha aquele aspecto de rebelde, de farrista, aquela voz grossa que não deveria combinar com uma música dançante e de letras suaves, mas que no conjunto da sua arte, caía bem feito uma luva. Tenho em um dos seus hits, a minha favorita: Gostava tanto de você. Não vou ficar não tem a melhor letra, mas certamente tem um dos melhores instrumentais, carregado em influência blues. Por motivos óbvios, eu gostava quando Tim Maia rompia com a MPB e voava pelo território do Jazz, Blues e Soul. Era quando eu o via como singular.
 
De qualquer forma, ele deixou sua marca na música brasileira, faz falta no cenário, mesmo que seja para arrumar uma das suas homéricas confusões com os técnicos de som ou com os empresários ou a mídia... mas, acima disso, pelo talento. Por falar simples e ainda assim soar poético. Encerro com um vídeo que traz a sua irreverência e seu talento também.
 
 Obrigado, Tim Maia!

sábado, 12 de março de 2011

Músicas para (nem) todas as horas


(Foto: Getty Images)

Uma rápida conversa (sim, daquelas de mesa de bar) sobre que músicas se tocar em determinadas situações, surgiu uma idéia que, sem pestanejar, transformei em inspiração para texto. Aliás, acho que estou treinando isso. Acaba sendo divertido. Antes de tudo, quero desculpar-me pela ausência. O período de Carnaval é tumultuado no trabalho formal que exerço. Bem, o texto de hoje é sobre músicas para não se tocar em casamentos!

Existem aquelas músicas, várias delas, na verdade, que chega na hora da festa de casamento se toca independente do que seja o tema dela, mas para alguém chato como eu, que gosta de prestar atenção em letras de música, acaba pegando mal. A idéia é divertir, claro, mas, puxa vida, estamos falando de um casamento! Uma união de pessoas! Então, pelo menos em momentos em que se corra o risco das pessoas prestarem atenção nas músicas (e essas pessoas incluem o noivo e a noiva também, claro!) vamos evitar as seguintes músicas no set list:

All Apologies (Nirvana): não dá para tocar uma música onde o refrão diz: “i’m married, burried” (estou casado, enterrado). Definitivamente, não é a mais indicada para um playlist de casamento.

It ain’t me babe (Bob Dylan): Esta talvez seja a campeã de antiromantismo! A letra dela é toda um balde de água fria que o sujeito joga na mulher que o ama. Os versos são basicamente descrevendo tudo o que a mulher deseja de um homem e o refrão, impiedosamente, fala: “but it ain’t me, babe! No, no, no, it ain’t me, babe. It ain’t me you’re looking for, babe” (mas não sou eu, baby. Não, não, não, não sou eu, baby. Não sou eu quem você está procurando). Incrivelmente, Johnny Cash, que tornou essa música famosa, não raro tocava essa música em dueto com a sua esposa, June Carter, mulher por quem foi eternamente apaixonado.

Medo da chuva (Raul Seixas): “como as pedras imóveis na praia eu fico ao seu lado sem saber dos amores que a vida me trouxe e eu não pude viver” [...] “porque quando eu jurei meu amor eu traí a mim mesmo; hoje eu sei que ninguém nesse mundo é feliz tendo amado uma vez”. Ok. Acho que essa música dispensa qualquer comentário do motivo de estar na lista negra das músicas para casamento!

Eu sei (Legião Urbana): Essa não é tão grave, não. Se a idéia desse texto fosse fazer um top 10, talvez essa fosse a última, a mais light, mas o começo dela, fosse um diálogo, não é dos mais sensíveis: “sexo verbal não faz meu estilo, palavras são erros e os erros são seus”. Ok, se não houver outra opção, esta está liberada, mas convém não arriscar.

Love Kills (Ramones): esta fala de um universo meio submundo, mas merece estar na lista pelo seu refrão e título. Em meio a este universo nada romântico, ele sela falando: “o amor mata”, meio que colocando a culpa do amor em toda a sujeira de que o sujeito da música se envolve. Desculpa, Ramones, mas não dá colocar essa num casamento (como se fosse pretensão deles, mas tudo bem).

Babe i’m gonna leave you (Led Zeppelin): a música trata de um diálogo onde o sujeito fala o tempo inteiro que vai ter que deixar a mulher. Não dá para ser mais inapropriado do que isso justamente numa festa de união de casais!

Insensível (Titãs): sobre insensibilidade, esta música garante seu lugar na lista de proibidas para casamentos quando fala exatamente: “é a verdade mais pura eu não consigo amar [...] Insensível, insensível você diz, impossível fazer você feliz”. Realmente, não dá.

Sexo blues (Camisa de Vênus): com a franqueza já conhecida do Camisa de Vênus, e sem papas na língua, a música fala de forma explícita que o sujeito só quer comer a mulher e ponto final. Romântico isso, não? Não, Marcelo, essa vai ficar de fora!

A sua (Raimundos): conhecendo a banda, dá até para imaginar pior, mas não é das mais pesadas, não. Só que o refrão diz: “i’m tired of believing in you, girl/ I tried to believe you” (estou cansado de acreditar em você, garota. Eu tentei acreditar em você). E a música trata de um cara que gostava muito de uma mulher, mas a está deixando por não acreditar mais nela.

A gente é tudo igual (Ultraje a Rigor): bom, do Ultraje não é de se esperar uma música romântica mesmo, mas esta é demais! A música fala de forma direta que quase todas as mulheres que o sujeito teve ele desejou que sumisse depois do rala-e-rola. E, mais, que quase todas as mulheres que ele conheceu são infiéis. Acho que esta música disputaria liderança com a do Bob Dylan.

É claro que na real mesmo, isso não faz tanta diferença porque ninguém lá está prestando atenção nas letras da música em uma festa e querem mais é se divertir, mas achei um assunto legal de se pensar! Esta foi, então, a lista de músicas para não se tocar em um casamento. Sem compromisso, sem seriedade, mas, admita, com coerência! Vou encerrar com duas das que coloquei aí.

Valeu!