sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Dos outros e nós


Poucas coisas me impressionam tanto quanto a atitude robótica que a sociedade aprendeu a desenvolver. Na verdade, pior do que isso, instituiu postura obrigatória na relação interpessoal, ao menos, com estranhos. E muitas vezes estamos no "piloto automático" e não percebemos.

Parênteses: o "piloto automático" é aquele momento em que estamos pura e simplesmente executando ações, sem raciocinar sobre o que está sendo feito, sem refletir, sem formar opinião... nada! 





Continuando: Num desses momentos corriqueiros, estou eu pegando um ônibus e tive um lapso de lucidez, saindo do automático. Putz. É agoniante. Pedi licença a pessoa que estava sentada no banco do corredor, para que eu pudesse sentar no banco da janela. Ela saiu do banco, eu passei, sentei, ela sentou. Olhei e disse "obrigado" (como manda a boa educação). A pessoa, sem sequer me olhar, falou um "de nada" como se fosse um gravador quando pressionado "play". Claro que eu também devo ter feito a mesma coisa, muito embora eu tenha olhado para observar a indiferença que eu sabia que estaria por vir. Depois disso, continuei olhando todos no ônibus e fiquei reparando o quanto é ridícula a postura de estar dividindo um lugar comum com outra pessoa e ter a obrigação moral de ignorá-la completamente. Aí, ficamos como se com viseiras de cavalo proibidos de olhar para o lado. Aliás, se mexer também é um constrangimento, pois vai inevitavelmente tocar no outro.

Comecei a rir sozinho. É claro, fui censurado com olhares alheios, pois é contra a regra de conduta indiferente interpessoal expressar qualquer tipo de atitude humana. Para dispersar a atenção dos alarmados, virei-me para a janela. Piorou. Comecei a reparar nos carros. Claro que lá é diferente, já que as pessoas ao lado se conhecem. Para os conhecidos a regra de conduta não se aplica. Ou ao menos, em grau menor. O problema é quando percebem que outras pessoas a estão olhando; não só eu, mas os outros carros ao lado também. A reação beira a agressividade explícita.

Já tentou olhar para alguém na rua sorrindo? Como uma prevenção exacerbada, se o outro estiver sorrindo também, ele muda a expressão para algo próximo de raiva instantaneamente. Não sei se para deixar claro que, caso você esteja com segundas intenções,  ele não está, ou se é apenas por se sentir invadido em sua "personal bubble".

O que me deixa mais puto, não é que existam esse tipo de reações, mas que isso seja o normal. A indiferença é o normal. É a via de regra. A cultura da distância. Agora, o estranho é que na internet tudo muda. Aí parece uma grande feira onde todos se cumprimentam, todos se falam, tudo é aceitável, tudo é normal. Inverte: o recluso é esquisito. "Porra o cara tem twitter, mas não posta nada! Sacanagem!". As celebridades que estão no twitter, por exemplo, falam com todo mundo, respondem todo mundo. Aí achamos que estamos íntimos deles, né? Experimenta falar com algum deles na rua! Duvido! Coisa esquisita mesmo. Não dá para entender.

Esses mesmos seres humanos (?) reclamam de carência! Mente humana é realmente confusa. Se você for reclamar de solidão, lembre-se desses detalhes. Nossa robotização despercebida pode ser culpada de grande parte disso tudo. Repensar. Sair dos moldes. Romper as regras.

Um bom fim de semana à todos!



2 comentários:

  1. Atitudes robóticas acontecem o tempo todo, com várias pessoas, incluindo nós. Mas o melhor da vida é quebrar esse gelo, conviver com alguém que você tenha tanta intimidade que não precise fingir nada. Gostei muito do blog! Voltarei.

    ResponderExcluir
  2. Amei o texto... acontece assim mesmo e as vezes precisamos dar uma "auto-sacudida" pra não cometer mais esses deslizes, não esfriar. Esse texto é um ótimo material para refletir. Beijos!

    ResponderExcluir